LEMBRANÇA DE EMÍLIO MOURA

Quando a verdade é desconhecida, mentir não faz mal. Não sei se Emílio Moura foi meu parente. O que sei é que, como eu, nasceu em Dores do Indaiá; e que se chamava Moura, como minha mãe, que foi Ana. Nasceu em 1902, quatro décadas antes de mim, mas tive a felicidade de conhecê-lo na prova oral de português do vestibular. 

A quem nunca o leu, resta uma bela oportunidade, o Itinerário Poético publicado pela Universidade Federal de Minas Gerais. 

O volume que tenho em mãos é uma pequena antologia publicada em 1971, pela Editora Leitura. Coube a Tarcísio Meira César redigir o texto que ocupa as duas orelhas do livro. Texto certeiro, impecável. A certa altura, comparando a poesia dos dois grandes amigos, Emílio e Drummond, Tarcísio vai ao ponto:

“Com nenhum poeta brasileiro tem Emílio Moura mais afinidade do que com Carlos Drummond de Andrade, e com nenhum outro encontra tantos pontos de contraste. Em ambos prevalece a atração, a magia abissal do enigma, e o esquisito que esbarra nas fronteiras do bizarro, que são os limites do ser. 

Mas eis a diferença: Emílio Moura não é de Itabira. Não tem ferro na alma. Enquanto Drummond se debruça sobre o social, essência mesma da poesia épico-dramática, ele simplesmente se concentra sobre o eu, que é a essência da poesia lírica”. 

Dá-me vontade de transcrever todos os poemas dessa Antologia, mas como, se minhas mãos já padecem de alguma artrose? 

Perdoem-me se lhes ofereço apenas este:

POEMA

“Duro caminho é o de saber que não há caminho.

O que há são fragmentos de rota que o tecido do acaso

une ou desune. Estar, andar. Identificar-se com as coisas, com o tempo. 

Estar aqui, ali. Estar antigamente, estar futuro, ou buscar-se no espelho onde não  há espelho.

Isso é  tudo. Mesmo assim nós sonhamos, e sonhamos um roteiro, um destino.

Não no espaço, ou no tempo, mas na parte de nós, ah, tão frágil, que se devora

e, perdida, se salva”.

Texto de Bolívar Lamounier. 

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