FRAGMENTOS BEM MIÚDOS


Meus amigos e amigas não imaginam quantas coisas fiz na vida, instigado pela necessidade do vil metal. 

Na infância, plantei e colhi feijão, milho e até algodão. Dei tiros de espingarda para afugentar os passarinhos que tentavam devorar o arrozal. Com uma espingardinha à-toa, claro, que funcionava naquele esquema de espoleta – pólvora- bucha – alguns grãos de chumbo e outra bucha. 

Dominei nos mínimos detalhes a arte de fazer tijolos artesanais; quem duvidar, leia no capítulo 5 as págs.44-48 de meu livro “De onde, para onde” (Editora Global). Entreguei leite, de uma forma que já deve ter desaparecido: a cavalo, carregando dois latões, um de cada lado. Pelas seis da tarde, quando o  ônibus proveniente de Belo Horizonte chegava a Dores, a garotada corria para pegar exemplares do jornal Estado de Minas e levá-los aos assinantes. Fiz isso muitas vezes. 

Em Belo Horizonte, comecei a trabalhar aos treze anos, com autorização do juiz de menores. Trabalhei no Hotel Ambassy, no -Banco da Lavoura e, pasmem, como inspetor de alunos no Colégio Lúcio dos Santos, onde tive muitas dores de cabeça com o irrequieto Nelson Ned, que aos 14 anos já tinha um vozeirão e iria se profissionalizar como um cantor de sucesso. Tentei até empresariar um artista: fui ao Rio e contratei o violonista paraguaio Solón Ayala para um recital em Belo Horizonte, um sucesso de público que me deu um senhor prejuízo. 

Mas o que acima vai dito pertence a um passado distante. Entre uma maluquice e outra, até arranjei tempo para estudar um pouco, fiz doutorado nos Estados Unidos, etc etc. A parte recente é mais engraçada. Anos atrás, encasquetei de fazer um filme sobre a inquisição em Minas no começo do século 17. Quem leu minha tentativa de screenplay achou bonito, mas dinheiro que é bom, nada. O financiamento que consegui levantar foi exatamente zero. Aí resolvi mudar radicalmente de ramo.   

Decidi investir na criação de serpentes peçonhentas, para vender o veneno. Creiam-me, estudei a fundo o assunto. Mas um especialista garantiu-me que eu iria à falência em 15 dias. Posso ser bobo, mas besta não sou, certo? Desisti. O lucro que tirei dessa experiência foi aprender que o termo “cobra” é um erro trazido pelos portugueses. O termo genérico é serpente. Cobra é um tipo específico de serpente.

Texto de Bolívar Lamounier. 

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