TURISMO E EDUCAÇÃO PATRIMONIAL


Segundo uma pesquisa feita a pedido do Ministério do Turismo, o turismo cultural aparece em terceiro lugar nas preferências daqueles que viajam pelo Brasil, só perdendo para o ecoturismo e para o turismo de aventura. Já a educação patrimonial vem ganhando destaque nas discussões sobre patrimônio histórico e também encontra um campo fértil dentro do turismo cultural. Um indício de que um crescimento mútuo pode estar começando é um intercâmbio crescente entre algumas instituições e órgãos que trabalham com as duas áreas, como o Iphan e o Ministério do Turismo, e o surgimento de alguns projetos precursores, como na cidade de São Luís do Maranhão e São João del Rei.

Mas qual seria definição exata de turismo cultural e até onde, teoricamente, ele está associado a educação patrimonial? Segundo Gabriela Nicolau dos Santos, professora do curso de turismo da Faculdade de Sergipe (FaSe), a prática do indivíduo deslocar-se de um local para outro motivado pela vontade e necessidade de enriquecimento cultural já existia em sociedades passadas, como por exemplo na Inglaterra, após a Idade Média: “Realizar essas viagens conferia para os que se aventuravam status e reconhecimento, uma vez que, tendo viajado por cerca de aproximadamente 3 anos (tempo de duração do chamado Grand Tour), esses nobres adquiriam conhecimentos sobre lugares por onde haviam passado e seus respectivos povos, que os tornavam, após a viagem, aptos para assumir importantes papéis em seu local de origem”, afirma.

A pesquisadora esclarece que, embora esse tipo de deslocamento não fosse denominado “turismo”, já anunciava o que viria a se tornar um fenômeno recente: “Hoje chamamos de turismo cultural esse tipo específico de viagem, intimamente associado à educação patrimonial”, esclarece. No entanto, ainda existe um caminho a ser percorrido: “A capacidade de “ensinar” ao viajante, traduzindo e esclarecendo informações relacionadas com a história do lugar, fazendo com que o patrimônio deixe de ser objeto de mera contemplação e passe a ser um meio de conhecer sua própria cultura e identidade, é o desafio de parte dos profissionais que trabalham com o turismo”, afirma Gabriela dos Santos.

Carolina Juliani de Campos, consultora do Ministério do Turismo (Mtur), também acrescenta que o turismo cultural é uma via de valorização do patrimônio: “Além de proporcionar o conhecimento e o respeito ao patrimônio, já que só preservamos aquilo que conhecemos, cria-se a possibilidade de uma sustentabilidade econômica para preservação dos bens em questão, por meio de taxas pagas pelos turistas visitantes”, afirma.

A consultora também afirma que o terceiro lugar atingido pelo turismo cultural na pesquisa encomendada pelo Ministério do Turismo revela que esse segmento apresenta um grande potencial de crescimento, pois existe uma demanda concreta, mesmo considerando as carências existentes: “apesar de existirem poucos serviços oferecidos na área de turismo cultural e também não existam grandes associações daqueles que trabalham nesse segmento, o interesse demonstrado pela pesquisa indica que ainda temos muito a crescer”, afirma.

Campos menciona alguns passos significativos que já foram dados, em 2005, para incentivar a consolidação do turismo cultural no país, como a elaboração de três documentos: “Marcos conceituais dos segmentos de turismo”, “Diretrizes para desenvolvimento do turismo cultural” e “Orientações básicas para para o desenvolvimento de roteiros ou produtos de turismo cultural”. Os dois primeiros estão previstos para serem lançados durante o Salão de Turismo, que ocorrerá de 2 a 6 de junho de 2006, em São Paulo. No entanto, os “Marcos conceituais” já estão a disposição dos estados para orientar o desenvolvimento de roteiros de turismo específicos. Já as “Orientações básicas” estarão disponíveis a partir de janeiro de 2006.

A relevância deste material, segundo Carolina de Campos, está no fato de servir de referência para as políticas do setor: “a definição oficial de qual é o conceito de turismo cultural adotado pelo país é importante para todos aqueles que desejam promover esta atividade respeitem suas particularidades”, diz. Campos também esclarece que não trata-se de um receituário a ser seguido, mas grandes linha norteadoras que visam ordenar a atividade, levando em consideração a legislação pertinente à área cultural, a capacidade de suporte do bem cultural para visitação, as estratégias de promoção da informação e comunicação entre os atores envolvidos, capacitação de pessoal, envolvimento da comunidade, promoção e comercialização turística, entre outros aspectos. Nas “Orientações básicas”, por exemplo, aparece como princípio a conciliação da sustentabilidade econômica com a preservação. “É importante na medida em que colocamos uma visão de mercado, mas com grande preocupação nas questões patrimoniais, na estruturação das visitações, na importância da interpretação patrimonial como via de educação e de atração entre o turista e o bem cultural”, conclui.

Outro dado que Campos faz questão de ressaltar é que a elaboração destes documentos também é resultado do trabalho de um grupo técnico temático de turismo cultural do Ministério do Turismo, criado no final de 2003. Composto de representantes de várias organizações e instituições da área de turismo, o grupo tem como objetivo estruturar o setor, levando em consideração o patrimônio material e imaterial existente no Brasil.

Um dos órgãos que participa deste grupo técnico é o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Segundo João Tadeu Gonçalves, gerente de educação e educação patrimonial do instituto, a participação do órgão se justifica pelas contribuições que o turismo pode dar na preservação do patrimônio: “A partir do momento em que os gestores de turismo estiverem plenamente convencidos da importância da preservação do patrimônio cultural, os projetos de uso turístico dos bens trarão em seu bojo, gradativamente, a preocupação não só com a sua manutenção, como também de difundir junto ao usuário os conceitos de preservação, num processo educativo”, afirma. Tadeu também cita o grupo técnico como o espaço onde foram desenvolvidas parcerias entre o Iphan e os ministérios do Meio Ambiente e do Turismo, além de um planejamento comum no que se refere a definição de destinos turísticos e projetos de usufruto dos bens patrimoniais pelo turismo.

Um exemplo concreto deste planejamento conjunto, citado tanto por João Tadeu Gonçalves como por Carolina de Campos, é uma reunião ocorrida nos dias 5 e 6 de dezembro de 2005, com membros dos ministérios da Cultura, do Turismo e da Educação, juntamente com representantes destas áreas no plano estadual e municipal, além das universidades federal e estadual do Maranhão. Segundo Gonçalves, o evento culminou com a constituição um grupo de trabalho encarregado de elaborar um projeto para a atuação integrada destes parceiros em uma ação a ser desenvolvida junto ao ensino fundamental da rede escolar de São Luís do Maranhão, enfocando o patrimônio cultural, ambiental e seu potencial turístico. “Este projeto deverá estar concluído, inclusive com material didático e capacitação de multiplicadores, ainda em 2006, estando prevista a sua implementação junto aos alunos a partir do 1º semestre de 2007”, afirma. Ele ainda menciona que a intenção é que experiência sirva de referência para projetos futuros em outras regiões do país. “Pretende-se, com esse piloto, encontrar uma formatação a ser posteriormente implantada em outros pontos do país”, diz. Para Campos, a expectativa também é grande: “Esperamos que o projeto possa subsidiar uma futura política nacional de educação patrimonial”.

É importante mencionar que, em alguns municípios e estados, algumas iniciativas também já avançaram nesta aproximação entre educação patrimonial e turismo cultural. Segundo Gabriela Nicolau dos Santos, a cidade de São João del Rei é um bom exemplo. A cidade inseriu no seu plano diretor ações de contemplam o turismo e a valorização do patrimônio: “São ações voltadas para a sensibilização da comunidade local, que deve ser a primeira a saber de sua história, a importância de seus bens patrimoniais, tanto para valorização de sua identidade, quanto para seu possível uso comercial”, afirma.

Um ponto-chave para que essas ações sejam bem sucedidas, segundo Santos, é a formação e a capacitação profissional, principalmente em áreas onde já existe uma demanda turística, como São João del Rei: “A formação e capacitação profissional nos vários níveis de atuação e áreas de especialização atende à demanda de mão-de-obra gerada a partir da expansão do mercado do turismo”, afirma.

Nesse sentido, ela também destaca o crescimento recente de cursos de pós-graduação voltados para este segmento, em especial alguns que oferecem instrumentos para que turismo e educação patrimonial se aproximem cada vez mais: “O curso de mestrado em Cultura e Turismo, oferecido pela Universidade Federal da Bahia (UFBa), assim como os programas de especialização em patrimônio promovidos por instituições como Iphan e Unesco, são, certamente, grandes promessas de habilitação e capacitação de uma equipe de pesquisadores e de mão-de-obra especializada preocupada em trabalhar conjuntamente a relação – complexa - entre turismo e educação patrimonial”, conclui.

Fonte: www.labjor.unicamp.br

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