EXPEDIÇÃO BRASIL GASTRONÔMICO
Seis estados, 51
cidades e mais de 81 mil quilômetros. Essa foi a trajetória da equipe que
produziu o primeiro livro da série “Expedição Brasil Gastronômico” (Bocatto),
projeto que revela a diversidade da culinária brasileira. Em vez de focar em
restaurantes badalados, acessíveis apenas a uma pequena parcela da população, a
obra se debruça sobre toda a cadeia produtiva da gastronomia: origem e produção
da matéria prima, centros de distribuição pitorescos e o consumo final.
“Quisemos mostrar que
gastronomia é muito mais que o trabalho na cozinha. Ela desenvolve pessoas
anônimas que se dedicam a plantar, colher, transportar e vender produtos
frescos, de qualidade, marca da nossa cultura”, relata o idealizador da “Expedição”,
Rodrigo Ferraz.
As bases do projeto
foram lançadas ainda em 2012, no Festival de Cultura e Gastronomia de
Tiradentes, em Minas Gerais. “A proposta inicial era redescobrir os
ingredientes-base das 12 cidades sede da Copa do Mundo. Porém, no decorrer da
expedição, a equipe decidiu ampliar o conceito e levar em consideração seis
biomas brasileiros e, a partir deles, identificar os territórios, fatores
geográficos e culturais que revelam por que cada produto é tão especial naquela
região”, explica a jornalista gastronômica Guta Chaves, uma das pesquisadoras e
coautora.
Minas Gerais, Rio de
Janeiro, Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Amazonas são os estados
contemplados no primeiro volume. Com uma gastronomia diversificada, a expedição
precisou elencar critérios bastante rígidos para definir o que seria, de fato,
apresentado ao público.
“Valorizamos os
costumes alimentares das comunidades, a qualidade excepcional dos ingredientes
e produtos orgânicos e cooperativas de subsistências, que promovem vida digna
aos trabalhadores do campo”, lista Guta Chaves.
Chefs renomados de
cada estado também contribuíram para a obra, com receitas a base de
ingredientes regionais – a exemplo do mineiro Ivo Faria, do restaurante Vecchio
Sogno, em Belo Horizonte, com a receita de panturrilha de porco; do
pernambucano Bruno Catão, do restaurante Parraxaxá, no Recife, com seu guisado
de galinha-d’angola; e do alemão Bernard Twardy, que escolheu Fortaleza para
viver e desenvolver o filé de sol com tangerina.
Ingredientes
consagrados, como o queijo Canastra, em São Roque de Minas, e as trutas da
Mantiqueira, no Rio de Janeiro, se mesclam a algumas surpresas. O clima semi-árido
e seco de Mossoró (RN), por exemplo, propicia boas condições para produção de
flor de sal, obtida a partir dos cristais colhidos na camada superficial das
salinas, usada para finalização gourmet de diversos pratos.
O sudeste também
marca presença com a cachaça produzida no Vale do Açúcar, no Rio de Janeiro, e
em Salinas, no norte de Minas Gerais.
O gosto de um Brasil
ainda exótico para quem vive mais ao sul se exibe nos rincões da Amazônia, desbravada
a barco pela expedição. É lá que vivem os descendentes da etnia saterê-mauê,
que colhem toneladas de guaraná todos os anos, produto exportado para Itália e
para França. Mais de 20 aldeias da mesma tribo também tem como herança secular
a domesticação de abelhas silvestres, especialmente da espécie canudo, que não
possui ferrão. Mas nada se compara á produção das comunidades Tucano e Dessana,
ás margens dos afluentes do Rio Amazonas. Por lá, a tradição é coletar a cabeça
do cupim maniuara, confundido com formiga, com o qual se faz uma farofa,
apreciada com tucupi, um caldo feito de mandioca-brava.
Texto de Fernando
Torres para a Revista Manuel Bernardes.
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